O Sol passa por Libra, signo de Vênus, que, por sua vez, passa por Leão, signo do Sol. A astrologia chama de recepção mútua esse diálogo de dois astros em visita sincrônica ao signo do outro. E qualquer bom contato entre Sol e Vênus evoca temas como consciência e amor, vida e prazer. Convenhamos: sob o chumbo grosso desse ano, estamos por demais carentes da validação desses substantivos. Não à toa, Vênus esteve na mídia nas últimas semanas. A descoberta de fosfina nas nuvens do planeta atiçou a possibilidade de haver alguma forma de vida por lá. Ao mesmo tempo, o Papa Francisco inflamou os carolas ao declarar que o prazer sexual vem de Deus e está a serviço da vida – e na astrologia esse assunto pertence à simbologia venusiana.
Vênus serve ao Sol: o prazer dá a graça do viver. É a satisfação dos nossos desejos e a definição do que valorizamos (Vênus) que reforçam nossa percepção de sermos pessoas únicas e especiais (Sol). Quando Vênus é desprezado, o Sol se enfraquece. Sem uma boa autoestima e um sólido respeito aos próprios valores, nossa identidade se debilita e pode preferir obedecer cegamente a poderes externos, anulando-se. E o amor, outro tema venusiano, também será tingido por essa relação. Ou seja, se nosso amor-próprio for ferido ou negado, o amor que iremos atrair tenderá a espelhar essa falta, resultando no que hoje chamamos de relacionamentos tóxicos. Vênus adora espelhos. O próprio símbolo astrológico do planeta se assemelha a um espelho estilizado.
Na mitologia grega, Afrodite, a mais bela das deusas, sincretizada depois na Vênus romana, vivia de espalhar o desejo entre todas as criaturas, fossem deuses ou mortais, para que a vida se manifestasse pelo prazer da criação. Dona de si mesma e muito vaidosa, ela portava um cinturão mágico que a tornava absolutamente irresistível. Pelas analogias astrológicas, a posição do planeta Vênus em nosso mapa de nascimento vai dar pistas de nosso próprio potencial sedutor e provedor de autoestima: as qualidades que possuímos interiormente e que, quando espelhadas no exterior, nos trazem alegria e bem-estar, além de agregar valor ao nosso ser. Em outras palavras, Vênus é o belo em nós refletido lá fora. Isso pode soar surpreendente: o que achamos belo e gostamos já existe dentro de nós!
E a prazerosa vibração de beleza venusiana pode assumir muitas faces, das mais materiais às mais abstratas. Uns sentem-se bem – e seduzem – com roupas impecáveis e o corpo em forma; outros, com imaginação e arte. Uns fascinam com o dom de entregar-se; outros, com liberdade e desapego. O que importa é encontrar o tributo adequado a essa força que nos habita e que pede alegria e contentamento ao nosso modo único. “O que é de gosto regala a vida”, já diz o ditado, dando conta da relação entre prazer pessoal e sentido para o viver.
Contudo, nesse áspero tempo de restrição e desalento, ficou mais difícil praticar o que apreciamos. Ah, quando pudermos viver o amor ou buscá-lo! Dar aquele beijo! Sair por aí! Se amontoar! Então, que essa espera se verta em lucidez. Que a memória do já vivido nos revele o que deve realmente permanecer. Há uma crise geral de valores. Nessa dura travessia, o verdadeiro amor e o prazer possível resistirão, mais até do que a suposta forma de vida no ambiente hostil do planeta Vênus. Pois são presentes divinos – o Papa está certo. E enquanto não chega um tempo mais leve, cantemos com Fito Paez: “Y dale alegría, alegría a mi corazón...”