O ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, afirmou nesta quinta-feira, dia 20, que a remoção completa dos palestinos da Faixa de Gaza, proposta por Donald Trump, é um "desdobramento aterrador" da guerra entre Israel e o grupo terrorista Hamas. Vieira criticou indiretamente a pretensão do presidente dos Estados Unidos, sem mencioná-lo, na abertura da reunião de chanceleres do G20, em Johannesburgo, na África do Sul.
"A ideia proposta recentemente de se expulsar toda a população de Gaza, em desrespeito aos princípios mais fundamentais do direito internacional, é um desdobramento aterrador", afirmou o chanceler de Luiz Inácio Lula da Silva.
Elogiada pelo governo do premiê Binyamin Netanyahu, ao lado de quem a Trump apresentou sua proposta, a possível remoção forçada dos palestinos recebeu repúdio amplo na comunidade internacional.
Durante discurso na reunião do G20, o ministro de Lula voltou a defender a criação do Estado Palestino, algo endossado pelo ex-presidente americano Joe Biden, e citou uma frase literal do secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres: "É essencial evitar qualquer forma de limpeza étnica".
O ministro celebrou o acordos de cessar-fogo entre Hamas e Israel e no Líbano, mas apelou para que seja rigorosamente implementado e que dele resulte a retirada completa das forças israelenses de Gaza, a libertação de todos os reféns israelenses nas mãos do grupo terrorista, e o acesso irrestrito de ajuda humanitária à faixa.
"A guerra em Gaza revela quem paga o preço quando a diplomacia falha. Após 15 meses de combates, mais de 47.000 palestinos e 1.200 israelenses perderam suas vidas, incluindo muitas mulheres e crianças entre as vítimas. A Faixa de Gaza está devastada, e a maior parte de sua infraestrutura civil, destruída", disse o ministro.
Em outro contraponto à diplomacia de Trump, Vieira defendeu a posição de Lula em favor de que a Rússia e a Ucrânia devem estar representadas nas negociações para solucionar a guerra entre os países.
Na véspera, o próprio Lula afirmou que era um erro Trump decidir liderar negociações sozinho, à revelia do governo ucraniano e de representantes da União Europeia.
No próximo dia 24, segunda-feira, a invasão do território ucraniano pelas forças russas completa três anos. O ministro destacou que, desde então, houve "uma escalada na crise humanitária e na corrida armamentista".
Vieira disse que o Brasil sempre defendeu que fossem consideradas "preocupações de segurança" de todas as partes. "O Brasil também reconhece a necessidade de reiterar que qualquer solução viável para essa guerra deve surgir de um processo de paz que inclua ambos os lados do conflito na mesa de negociações - algo que nosso país e muitos outros vêm enfatizando desde o início das hostilidades", afirmou o ministro.
"O Brasil e a China lançaram uma iniciativa conjunta para apoiar futuros esforços de paz. Em setembro passado, sediamos, em Nova York, a Reunião de Alto Nível de Países do Sul Global sobre o Conflito na Ucrânia. Como resultado, foi criado 'o Grupo de Amigos da Paz', que agora inclui 17 países."
Boicote
Trump decidiu boicotar as primeiras reuniões do G20, presidido neste ano pela África do Sul. O secretário de Estado, Marco Rubio, não compareceu ao primeiro encontro de chanceleres alegando que não iria "mimar o antiamericanismo". O secretário do Tesouro, Scott Bessent, também deve faltar na semana que vem, segundo o jornal New York Times.
O governo Trump está em rota de colisão com o presidente Cyril Ramaphosa, por causa de uma lei que permite desapropriação de terras, em alguns casos sem compensação, em território sul-africano.
Trump interrompeu assistência financeira ao país, potencialmente impactando 17% dos fundos do programa de combate ao HIV local, sob argumento de que Ramaphosa autorizara suposto "confisco de terras" para punir fazendeiros brancos. O presidente sul-africano negou. A disputa fundiária e a concentração de terras nas mãos da minoria branca remonta ao período do Apartheid.
De origem sul-africana, o empresário bilionário Elon Musk, aliado de Trump e responsável pelo Departamento de Eficiência Governamental nos EUA, é um crítico contumaz do que chama de leis de propriedade racistas e genocídio de brancos no país. Os Estados Unidos também se queixaram da ação movida na Corte Internacional de Justiça pela África do Sul contra Israel, acusado de promover genocídio na Faixa de Gaza.