Novas manifestações e bloqueios pacíficos de estradas aconteceram no Panamá na sexta-feira (15), em protesto contra o aumento da inflação e contra a corrupção, enquanto governo e sindicatos negociam, diante do clamor da população, para que as autoridades reduzam o preço dos combustíveis, alimentos e remédios.
Da Cidade do Panamá até o oeste, ao longo da rodovia que liga o país à América Central, há pelo menos uma dezena de bloqueios de estrada que impedem a chegada de suprimentos não apenas à capital, mas também às províncias.
É o caso de Santiago de Veraguas, a cerca de 250 quilômetros da capital, onde se vê filas de caminhões impedindo a passagem.
"Essa luta é de todos os panamenhos a pé, devido ao aumento dos combustíveis, da cesta básica, dos remédios", explicou Eduardo Arroyo, vice-prefeito do distrito de Atalaya, em Veraguas.
"Mostramos que nós, pobres, somos mais. (...) mudança de governo, mudança de governo, e o pobre, como sempre, esquecido", acrescentou.
Entrando em Santiago, uma nova barricada, desta vez do povo indígena Ngäbe-Bugle, bloqueia o trânsito. Eles dançam para aplacar a espera.
"Aqui na cidade de Santiago, pela primeira vez, você vê como o povo Ngäbe-Bugle se instala [nos protestos] e é acompanhado pelo povo das comunidades vizinhas", disse à AFP a professora Yadira Pino.
Na Cidade do Panamá, trabalhadores do setor da construção civil do sindicato Suntracs, o maior do país, manifestaram-se ontem por várias ruas e avenidas. Algumas delas foram parcialmente interditadas ao trânsito de veículos com barricadas.
"Aqui estamos em outra jornada de luta das muitas que estamos dispostos a seguir travando, se o governo inepto do presidente Laurentino Cortizo não escutar o povo", disse Gregorio Guerrel, do Suntracs, conforme vídeo publicado pelo sindicato na sexta-feira.
Na via Pan-Americana, que liga o Panamá com a América Central e é vital para o transporte, o comércio e a distribuição de mercadorias para a Cidade do Panamá, os bloqueios de caminhões também continuaram, deixando milhares de pessoas presas. O canal interoceânico opera, porém, normalmente.
- Negociações -
Este país centro-americano de 4,2 milhões de habitantes vive uma de suas maiores crises sociais desde que, em 1989, caiu a ditadura militar do general Manuel Antonio Noriega após a invasão dos Estados Unidos.
O descontentamento se produz em um cenário de 4,2% de inflação interanual registrado em maio, uma taxa de desemprego de cerca de 10% e um aumento no preço do combustível de 47% desde o início do ano.
A situação provocou o desabastecimento de combustíveis em algumas áreas do país, enquanto a maioria dos postos de venda ao público do principal mercado de alimentos da Cidade do Panamá se viu obrigada a fechar por falta de produtos.
"O povo precisa e pede para ser ouvido, porque as instituições de representação tradicionais não funcionam", explicou à AFP o diretor do Centro Internacional de Estudos Políticos e Sociais, Harry Brown.
Em uma tentativa de acalmar os ânimos, Cortizo anunciou a redução e o congelamento dos preços dos combustíveis, que passou de US$ 5,17 o galão de gasolina (3,78 litros) para US$ 3,95 a partir de ontem, assim como de uma dezena de alimentos. Os sindicatos rejeitam essas medidas, por considerá-las insuficientes.
"Esta geração não tinha vivido uma crise da magnitude desta que hoje domina o nosso país", declarou o ex-presidente panamenho Martín Torrijos na sexta-feira.
"A convulsão social que estamos vivendo não é produto de um fato isolado, ou dos aumentos conjunturais de combustíveis e alimentos. É o acúmulo, no tempo, de demandas não atendidas e de uma deterioração evidente da qualidade de vida dos panamenhos", acrescentou.
O governo e os grupos que impulsionam os protestos retomaram o diálogo em Santiago, informou a Defensoria do Povo panamenha, que atua como mediadora. Em meio às negociações, a polícia relatou a ocorrência de incidentes isolados em Chiriquí.
Na quinta-feira (14), o presidente social-democrata instalou outra mesa de negociação na Cidade do Panamá, com a mediação da Igreja Católica, mas os sindicatos não participaram dela.
"Não tenho dúvida de que, com um diálogo sincero, sem agendas duplas, poderemos continuar avançando", disse Cortizo neste dia, classificando os bloqueios de estradas como "ilógicos".
* AFP