El Salvador começou a desativar nesta terça-feira (11) a crise política, com o presidente Nayib Bukele assegurando que acatará as medidas da Suprema Corte de Justiça sobre a separação de poderes depois de invadir o Congresso com o Exército no domingo.
"Embora não compartilhemos do que foi decidido pela Sala Constitucional (...), acataremos a ordem emanada" pela máxima corte, diz um comunicado da Presidência e do Conselho de ministros.
No domingo, ao ver frustrada uma convocação para uma sessão extraordinária invocando um artigo da Constituição, Bukele deu prazo de uma semana à Assembleia Legislativa de maioria opositora para que aprove um empréstimo de 109 milhões de dólares para equipar o Exército e a Polícia.
Minutos antes de dar o ultimato, o mandatário havia entrado na sede do Congresso cercado de policiais da tropa de choque e soldados do Exército, que usavam coletes à prova de balas e fuzis de assalto.
O Supremo determinou na segunda-feira a Bukele que "se abstenha de fazer uso da Força Armada em atividades contrárias aos fins constitucionalmente estabelecidos e pôr em risco a forma de governo republicano, democrático e representativo, o sistema pluralista e de forma particular, a separação de poderes".
Além disso, o máximo tribunal tornou sem efeito a convocação para a sessão extraordinária da Assembleia Legislativa feita pelo Conselho de Ministros.
O artigo 167 da Constituição outorga a este conselho a atribuição de realizar essa convocação quando "os interesses da República o demandarem".
Enquanto a crise acaba de ser resolvida, a corte ordenou ao ministro da Defesa, René Merino, e ao diretor da Polícia, Mauricio Arriaza, que "não exerçam funções e atividades distintas das que são obrigados constitucionalmente e legalmente".
Segundo o comunicado da Presidência, o Poder Executivo se mostrou "a todo momento respeitoso ao princípio de separação de poderes".
Avaliou ainda que as medidas cautelares da Corte "poderiam dificultar o trabalho efetivo" que o governo realiza pelos interesses do povo, razão pela qual exortou à Sala Constitucional a levar "em consideração os interesses atuais da República no tema da segurança".
- "Ferida mortal" -
Enquanto o clima político voltava à normalidade, analistas apontam que o país correu o risco de romper a ordem constitucional.
"Foi uma ferida mortal na democracia de El Salvador, um golpe do qual dificilmente o país vai poder se recuperar e cujos efeitos vamos ver em breve", declarou à AFP o analista Carlos Carcach, professor da Escola Superior de Economia e Negócios (ESEN).
O ocorrido no domingo mostrou "o pouco respeito" que Bukele tem pelo Estado de direito, acrescentou.
Os militares também ficaram no epicentro da crise, após irem à sede legislativa como uma demonstração de força.
"Ver a instituição armada instrumentalizada, sujando com suas botas o Salão Azul da Assembleia é verdadeiramente perturbador", refletiu o analista e professor universitário Roberto Cañas.
Esta ação "deixou todos atônitos e estupefatos", acrescentou.
"Acho que o ministro da Defesa terá que se demitir depois de permitir desta forma a atuação da força armada", declarou o diretor do Instituto de Direitos Humanos da Universidade Centro-americana (IDHUCA), José María Tojeira, à AFP.
O ato de Bukele, segundo Tojeira, se baseia no "apoio popular" que tem nas pesquisas, mas deve saber que um ato como o ocorrido no domingo "lhe tira popularidade e prestígio internacional".
O conflito tampouco é conveniente no plano econômico, afirma Cañas, apontando que as agências de classificação de risco "ficam atentas" e podem reduzir o nível de confiança para investimentos, em um país que precisa gerar emprego e ajudar os 30% dos 6,7 milhões de habitantes que vivem na pobreza.
* AFP